Re­pou­sar é pre­ciso


Em ge­ral, todo fi­nal de ano leva a gente a pen­sar em des­canso ou em “me­re­ci­das fé­rias”. No meu tempo de es­tu­dante, ha­via um pro­fes­sor que, ao che­gar ao fi­nal do ano le­tivo, di­zia: “as fé­rias são bem-vindas, mas, se não fo­rem bem apro­vei­ta­das, po­de­rão tra­zer abor­re­ci­men­tos… Saindo além do ritmo nor­mal, fa­cil­men­tese cai no re­la­xa­mento e na omis­são de cer­tos de­ve­res ina­diá­veis…

No Evan­ge­lho, se­gundo Ma­teus, Je­sus convida-nos a ca­mi­nhar sem can­sar: “Vinde a mim vós que es­tais can­sa­dos e fa­ti­ga­dos sob o peso dos vos­sos far­dos, e eu vos da­rei des­canso” (Mt 11, 28 – 30).

Não são pou­cos os que vi­vem hoje so­bre­car­re­ga­dos de tra­ba­lho, desgastando-se ao longo dos dias, das se­ma­nas, dos me­ses e dos anos. Por isso, ao che­gar o pe­ríodo de fé­rias do ve­rão, to­dos bus­cam, de uma ma­neira ou de ou­tra, um tempo de des­canso ou de pas­sa­tempo que os ajude a se li­ber­ta­rem das ten­sões e dos can­sa­ços acu­mu­la­dos ao longo dos dias.

Nos­sas ener­gias esgotam-se, por­que que­re­mos e pre­ci­sa­mos es­tar li­ga­dos a tudo. Com a mo­der­ni­dade e a alta tec­no­lo­gia na co­mu­ni­ca­ção, fi­ca­mos por den­tro de tudo o que acon­tece perto e longe de nós. Tudo nos en­volve e, de al­guma forma, nos toca. Sentimo-nos um pouco res­pon­sá­veis por aquilo que acon­tece no mundo… Sem fa­lar da la­buta diá­ria para ga­nhar o pão de cada dia ou para ob­ter um pouco mais de qua­li­dade de vida. Tudo isso é po­si­tivo, mas tam­bém nos leva a nos ques­ti­o­nar: até que ponto vale a pena vi­ver se­ma­nas e se­ma­nas numa cor­re­ria fre­né­tica?

A vida passa num ins­tante. É pre­ciso vi­ver com qua­li­dade de vida. Ex­pe­ri­men­tar a vida, vi­ver e con­vi­ver com quem ca­mi­nha lado a lado co­nosco: nossa fa­mí­lia, os co­le­gas de tra­ba­lho, os ami­gos.

O tempo do des­canso pla­ne­jado e aguar­dado ajuda-nos a re­or­ga­ni­zar nossa agenda in­te­rior, nossa re­gra de vida, a re­com­por nos­sas for­ças e a dar a de­vida im­por­tân­cia ao que de fato é im­por­tante em nossa vida.

Mas o que é des­can­sar? É su­fi­ci­ente re­cu­pe­rar nos­sas for­ças fí­si­cas, to­mando sol du­rante al­gu­mas ho­ras na praia de al­gum lindo mar? Co­nhe­cer be­los lu­ga­res? Será que basta es­que­cer nos­sos pro­ble­mas e con­fli­tos, mer­gu­lha­dos no ruído e no ba­ru­lho de nos­sas fes­tas e noi­ta­das? Ao re­tor­nar das fé­rias, não pou­cos sen­tem em seu in­te­rior a sen­sa­ção de tê-las per­dido, ou até, vol­tam mais can­sa­dos do que quando co­me­ça­ram as fé­rias. Acon­tece que tam­bém nas fé­rias po­de­mos cair na ti­ra­nia da agi­ta­ção, do ruído, da su­per­fi­ci­a­li­dade e da an­si­e­dade do des­frute fá­cil e es­go­tante. En­tão, que tipo de fé­rias de­ve­mos es­co­lher? O que re­al­mente fará res­tau­rar o co­ra­ção e aju­dará a ser­mos pes­soas me­lho­res?

Nem to­dos sa­bem des­can­sar. Você já pa­rou para pen­sar na im­por­tân­cia de des­can­sar? Já per­ce­beu que o des­canso é tam­bém um dom pre­ci­oso? E que deve ser bem apro­vei­tado? É co­mum acon­te­cer que ao re­tor­nar­mos das fé­rias, as pes­soas de nosso con­ví­vio es­pe­ram en­con­trar em nós pes­soas mais sau­dá­veis, mais se­re­nas, mais tran­qui­las. As fé­rias de­vem pro­por­ci­o­nar esse re­no­vado es­tado de es­pí­rito. Para isso é ne­ces­sá­rio encontrar-nos pro­fun­da­mente co­nosco mes­mos e bus­car o si­lên­cio, a calma e a se­re­ni­dade de es­pí­rito que tan­tas ve­zes nos fal­tam du­rante o ano, para es­cu­tar o me­lhor que há den­tro de nós e ao nosso re­dor.

Pre­ci­sa­mos lem­brar que uma vida in­tensa não é uma vida agi­tada. Que­re­mos ter tudo, açam­bar­car tudo e des­fru­tar de tudo. Rodeamo-nos de mil coi­sas su­pér­fluas e inú­teis que afo­gam nossa li­ber­dade e es­pon­ta­nei­dade. Pre­ci­sa­mos re­des­co­brir a be­leza da na­tu­reza, con­tem­plar a vida que brota perto de nós. Os pás­sa­ros que can­tam sem se pre­o­cu­par, pois o Pai do céu cuida tam­bém de­les, ou o per­fume da rosa que gra­tui­ta­mente es­pa­lha sua be­leza e for­mo­sura, ou a som­bra amiga de ár­vo­res ge­ne­ro­sas…

É pre­ciso des­co­brir que a fe­li­ci­dade tem pouco a ver com o pra­zer fá­cil. Lembremo-nos, en­fim, de que o sen­tido úl­timo da vida se re­vela a nós com mais cla­ri­dade na festa, na ale­gria com­par­ti­lhada, na ami­zade e na con­vi­vên­cia fra­terna. Mas, além disso, pre­ci­sa­mos en­rai­zar nossa vida em Deus “amigo da vida”, fonte do ver­da­deiro e de­fi­ni­tivo des­canso. Com Ele em nosso co­ra­ção o des­canso será res­tau­ra­dor. É pos­sí­vel o ser hu­mano des­can­sar sem encontrar-se com Deus? (cf. J.A. Pa­gola, o ca­mi­nho aberto por Je­sus, Vo­zes, 2013 — Pe­tró­po­lis, págs. 147 – 149). Nesse sen­tido, es­pero que te­nha­mos fé­rias ale­gres e res­tau­ra­do­ras.

Apro­veito a oca­sião para de­se­jar a to­dos os que­ri­dos lei­to­res e lei­to­ras de “A Boa No­tí­cia” um fe­liz e santo Na­tal, bem como um Novo Ano re­pleto de gra­ças e bên­çãos do Prín­cipe da Paz.

Dom Nel­son Wes­trupp, scj

Bispo Di­o­ce­sano de Santo An­dré

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